sábado, 18 de abril de 2015

A propósito da ruptura da Esquerda Marxista com o PT


Em relação à ruptura da Esquerda Marxista -seção brasileira da International Marxist Tendency de Alan Woods- com o Partido dos Trabalhadores (aqui), bem como de seu chamado por uma frente de esquerda, nós do blog Espaço Marxista gostaríamos de tecer algumas considerações.

De início, entendemos que essa ruptura -propriamente, proposta de saída a ser apresentada na conferência nacional de fins de abril- veio até tarde. Pensamos que a insistência demasiada em partidos social-democratas, da esquerda pequeno-burguesa ou burgueses com influência de massas (como nós classificamos o PT, conforme se vê aqui e aqui), sai da esfera do entrismo trotskysta e adentra, perigosamente, os meandros do pablismo. Mais de uma década do PT no governo foi suficiente para dar cabo de qualquer ilusão, e apenas ingênuos, quando não descarados oportunistas, insistiam na possibilidade de "disputar" o governo com tubarões como Renan, Collor, Sarney e a fina flor do coronelato brasileiro com os quais o PT pretendeu buscar "governabilidade". Esse pacto cobrou seu preço, e eis o PT refém de (mui) aliados insaciáveis e a classe trabalhadora brasileira lesada em direito após direito, haja vista que, diferentemente do que prega a conciliação de cores bonapartistas que propõe o lulismo, "não se pode dar a uma classe sem tirar de outra" (Marx no "18 Brumário").

É questão de princípio, portanto, para qualquer organização que se pretenda marxista revolucionária (insistimos na redundância, pois há os marxistas não-revolucionários, os diletantes e acadêmicos comentando a luta de classes a partir de seus gabinetes), romper com o PT, verificada a falência do partido em cumprir sua meta, lá no início dos anos 80, de governar para a classe trabalhadora (meta que já nasce confusa, tendo em vista a heterogeneidade e diversidade de referências já na formação do partido). Nesse sentido, saudamos a iniciativa dos companheiros da Esquerda Marxista de romper com o partido, em busca de, como diz o documento aludido acima, uma nova orientação de construção.

Todavia, conforme já falamos alhures, a organização revolucionária precisa ter a noção correta de tempo, de timing, para agir. Tanto medidas precipitadas quanto retardatárias são deletérias, e às vezes geram erros irreparáveis. É claro que é difícil, nas situações excepcionais da luta de classes, ter a exata noção de momento, porém, como diz Trotsky, "as organizações revolucionárias sérias se preparam para atuar, justamente, em 'circunstâncias excepcionais'" ("Stalinismo e bolchevismo"). Dizemos isso porque, no presente momento mais do que nunca, o PT está em franco processo de desmoralização perante a opinião pública, se arrastando de escândalo a escândalo, tachado de corrupto em horário nobre e prostrado diante dos "aliados". Ora, é fácil romper com o partido nessa conjuntura. A ruptura neste momento soa como um gesto de "abandonar o navio" antes que se vá a pique com ele. Há noção de momento aqui -sair antes que as coisas piorem- mas de tom oportunista, diferentemente do que seria a ruptura anos atrás, quando o PT, com as mesmíssimas políticas econômicas e práticas rasas da política burguesa, era todo-poderoso.

Isso é mais grave porque, em nossa avaliação, o mundo vive uma escalada reacionária fruto da tentativa do imperialismo ocidental de recuperar e manter terreno após a crise econômica de 2008 e diante do ascenso de um pólo alternativo sino-russo. Um dos alvos dessa escalada é o governo do PT que, do alto de suas contradições, possui ainda um lastro popular e operário e não tem implementado as contrarreformas na velocidade desejada. Nesse sentido, a neutralização do PT é palavra de ordem para tais setores reacionários, e para isso têm ao seu dispor um vasto cabedal de armas, das jurídicas e institucionais à força bruta.

A queda do PT, nesse contexto, seria catastrófica, pois significaria a ascensão dos estratos mais atrasados da sociedade (do Clube Militar e fascistas declarados à classe média "global" -de Rede Globo- que desfila de verde e amarelo pedindo intervenção militar) e a aplicação sem mediações do programa neoliberal máximo. E isso não podemos admitir, e por isso nos opomos frontalmente à qualquer tentativa de golpismo, não "em defesa do PT" mas sim em defesa da classe trabalhadora brasileira. Apoiaríamos de bom grado, e, mais que isso, estaríamos na linha de frente de qualquer movimentação proletária e progressista que estivesse por suplantar o governo vigente. Mas essa conjuntura não existe: não é o operariado que subirá ao poder com a queda de Dilma, e sim o que há de pior na direita brasileira. E isso, reitero, não podemos admitir.

Romper com o PT endereçando a ele toda a carga acaba por engrossar o caldo anti-petista de direita. E engrossar o anti-petismo é engrossar o anti-partidarismo e então o anti-comunismo. Lembremos junho de 2013, quando tudo que remotamente lembrasse a esquerda organizada era hostilizado nas ruas. Não é preciso, a essa altura, dizer que o PT não é comunista; sabemos disso, mas aos olhos da classe média fascistizada, Lula é o "Karl Marx de Garanhuns" (conforme o já famoso e caricato cartaz visto nas manifestações da direita em março) a, em conluio com as FARCs-EP e o Foro de São Paulo, entregar o Brasil aos bolivarianos de Cuba. São tempos nefastos. O PT, que é a antitese de uma prática socialista, é considerado socialista e assim somos todos jogados no mesmo balaio.

Diante disso, para nós é evidente que o que está em jogo é mais que o governo do PT. É a esquerda que está sob ataque, que é a mesma coisa que dizer que a classe trabalhadora está sob ataque (se estamos falando verdadeiramente em esquerda). Combater o golpismo não é, portanto, defender o PT, e sim defender os trabalhadores contra o violentíssimo ataque que sofrerá caso a oposição de direita ascenda ao poder. Por isso estivemos presentes no ato, tachado de "governista" pelos sectários das torres de marfim, do dia 13/ 03, bem como estaremos em qualquer outro cujo objetivo seja barrar a ofensiva de direita em curso. Mais do que isso, temos chamado a FRENTE ÚNICA ANTI-FASCISTA, ANTI-IMPERIALISTA e que, hoje, tem como tarefa também ser ANTI-GOLPISTA. Qualquer frente de esquerda do Brasil de hoje necessariamente terá esses desafios diante de si, por isso entendemos que a Esquerda Marxista falha por, ao convocá-la, não consignar claramente tais tarefas.

O PT é inimigo, decerto. Mas, na analogia adotada por Trotsky sobre o cenário alemão dos anos 30, é aquele inimigo que envenena; não mata de imediato. Antes de ser enfrentado, é preciso desarmar o inimigo com a pistola -na nossa conjuntura, a oposição de direita- essa sim a ameaça iminente, capaz de fulminar de imediato.

Diante de tudo isso, saudamos a iniciativa da Esquerda Marxista de buscar uma nova orientação, mas entendemos que erra ao fazê-lo em momento inoportuno e ao centrar o fogo da crítica no PT, enfraquecendo-o diante da opinião pública e da ofensiva de direita. Igualmente, somos entusiastas da frente de esquerda proposta, mas entendemos que é imperioso destacar o caráter anti-fascista e anti-golpista.
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