domingo, 12 de junho de 2016

A ofensiva contra os profissionais da educação no Rio de Janeiro


O Coletivo Espaço Marxista publica agora entrevista com a companheira Natália M., sobre a situação dos professores do município do Rio de Janeiro, governado pelo mafioso PMDB de Eduardo Paes (cujo sucessor apontado para as eleições municipais deste ano será o deputado federal agressor de mulheres Pedro Paulo). A companheira é professora do Ensino Fundamental da Rede Municipal do Rio de Janeiro com 10 anos de atuação em regência de turmas regulares.

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Coletivo Espaço Marxista- Companheira, fale sobre as condições de trabalho da categoria.

Natália M.- Em relação aos aspectos de saúde, há um elevado número de profissionais readaptados (desviados de suas funções originais) e licenciados (por inúmeros motivos, mas salta aos olhos a quantidade de profissionais sob atendimento psiquiátrico, com problemas de pressão, AVC, enfim, doenças desencadeadas pelo alto nível de estresse). O acúmulo de funções, o elevado quantitativo de alunos por turma, a carência de profissionais de apoio, as demandas sociais e de saúde por parte dos alunos, são situações que corroboram para a queda de rendimento profissional e precarização da saúde: trabalha-se em ambiente não climatizado, em condições mínimas de limpeza, áreas ao ar livre sem coberturas, muitos profissionais dividindo o mesmo espaço, falta de motivação para o trabalho etc.

Com relação ao trato entre professores e a equipe gestora, existe uma orientação imposta pela SME [Secretaria Municipal de Educação], abaixo dela as CRE’S [Coordenadorias Regionais de Educação] e ainda mais abaixo as direções das unidades escolares. Sob a batuta da SME conduzem as escolas qual nobres em relação aos seus feudos. São inúmeras as situações de assédio moral e perseguição aos críticos das políticas autoritárias. Paralelamente funciona uma rede de funcionários insatisfeitos, mas com suas aparências de pacatos cumpridores de ordens, caem nas graças de suas chefias imediatas conseguindo "privilégios" a troco de silêncio. Os que defendem seus pontos de vista são ridicularizados, desacreditados, até que consigam suas saídas da escola. Já vi profissionais da mais alta qualidade serem tocados para fora sob o discurso de "inadequação em relação ao perfil da escola".

Com relação às atividades pedagógicas, o que se pode notar é a crescente perda da autonomia, ou seja, perdemos cada vez mais espaço nas diretrizes educacionais nos tornando meros executores do planejamento vindo de cima. Recebemos apostilas e provas já formatadas e elaboradas sem a nossa participação. As turmas de projeto recebem materiais elaborados por OS’s, por exemplo.

Trabalhamos com cada vez menos oferta de recursos: equipamentos quebrados, falta de papel, falta de máquina copiadora, falta de material de papelaria, tudo o que impede o preparo de atividades elaboradas por nós. Nestas condições acabamos reféns do material produzido pela SME. A escola costumava receber R$90.000,00 ao ano e em 2015 foram depositados apenas R$25.000,00.

Em tempos de linguagem tecnológica avançada e de mudanças constantes, a conectividade aos canais virtuais é precária, insuficiente e inconstante, por parte dos alunos quase que nula.

Cito apenas estes tópicos mais básicos, mas os problemas são muitos.

CEM- O sindicato consegue mobilizar a categoria contra a política da Prefeitura?

NM- Jamais houve uma visita sequer de algum representante do sindicato onde atuo [NOTA: trata-se do SEPE, Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação do RJ], mesmo depois das grandes greves de 2013 e 2014. Nem mesmo em períodos eleitorais conseguimos saber quem são os nossos pretensos representantes.

CEM- Quais sãos as principais pautas da categoria hoje?

NM- A autonomia pedagógica, a reavaliação da aprovação automática, uma política responsável de inclusão para alunos portadores de deficiência, a melhoria das condições de funcionamento das escolas e de seus espaços físicos, a abertura de concursos para todos cargos (contra a terceirização, escola não é empresa), valorização pela via salarial, parceria com órgãos da saúde e da área social, mais verbas para a compra de materiais conforme a necessidade etc. Nos anos de gestão do governo Eduardo Paes a quantidade de direitos perdidos foi astronômica.

CEM- A categoria está mobilizada em torno de suas reivindicações?

NM- A categoria se sentiu mal representada nas greves de 2013/14. O que ocorreu foi um elevado número de desfiliações. Vejo vários perfis: os alienados por opção, os alienados clássicos, os acomodados que só reclamam no discurso (a maioria), uns poucos realmente esclarecidos quanto a gravidade da situação e os raríssimos engajados de forma direta. O contra-golpe do governo depois das greves citadas foi desmoralizante. Quase nada se avançou da pauta da categoria, além disso, houve um elevado número de profissionais processados administrativamente e com descontos salariais abusivos e injustificados – mesmo com decisão judicial favorável. Aliás, o atual governo desconsidera qualquer decisão judicial a ele desfavorável.

CEM- Quais são as soluções apontadas?

NM- Os poucos profissionais com atuação política sempre apontam o caminho das paralisações e greves. A média da categoria já não acredita mais nesta possibilidade justamente pelas consequências dos últimos episódio – onde até porrada da PM levamos. A desmoralização foi absoluta! Há uma mistura de revolta, vergonha. Nos encontros entre sindicato e representantes dos governo, as respostas para as demandas da pauta são sempre negativas com as frases feitas de que "não há verba", "não há isso", "não é possível". Não há qualquer avanço ou expectativa de melhoria. Fica o questionamento: qual seria a via possível?
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