sexta-feira, 30 de setembro de 2016

A direita latino-americana


O artigo abaixo versa sobre o caráter da direita de nosso continente e seu papel nefasto na história. Texto muito pertinente e oportuno, mas deixamos registrado aqui que temos reservas quanto à parte em que é falado em avanços populares sob os anos do PT, ao citar o governo golpista de Michel Temer. A imagem que escolhemos para ilustrar o post é um detalhe do mural "De la conquista al presente", de Diego Rivera, retratando Emiliano Zapata e Pancho Villa.

A direita latino-americana

Ricardo Arturo Salgado Bonilla

Poucas vezes paramos para pensar na direita do nosso continente, tratando de ver as coisas como ela vê. Como se assume em seu papel de classe dominante, responsável durante séculos por tudo aquilo que nossas sociedades têm passado. Essa direita é responsável por criar conceitos, princípios, valores e preconceitos em nossa história, e também no desenvolvimento de nossas economias.

É cômico, mas muitas vezes escutamos pessoas dizerem que a direita "sabe governar!", e, lamentavelmente, muita gente crê nisso. Logo essa direita, que, além de tudo, durante a segunda década deste século tem se dedicado a se autoproclamar a salvadora das classes mais pobres diante da ineficiência e corrupção da esquerda, a quem acusa de "repartir miséria".

Os "êxitos" da direta latinoamericana, porém, falam muito mal de sua posição dirigente. Poderíamos começar com esse assunto do "repartir miséria". Vivemos no continente mais desigual do planeta e onde se observa a pior distribuição de riqueza. É verdade que em muitos países existem milionários saídos dentre os mais pobres, como em contos de fadas, mas sua maior obra tem sido multiplicar exponencialmente a quantidade de pessoas pobres ou à beira da pobreza. Sem sombra de dúvidas, é a direita que merece o título de "repartidora e multiplicadora" de miséria.

Por trás desse duvidoso "mérito" há um crime histórico de nossa direita contra ela mesma. Ao renunciar à possibilidade de crescer no capitalismo mundial para disputar seus próprios interesses na geoestratégia global, se conformou em ser comandada pelas transnacionais do primeiro mundo, e aceitou o triste papel de ser simultaneamente o capataz dos interesses imperiais e o saqueador de sua própria terra.

A direita deste continente não possui sequer aspirações teóricas, ou a intenção de propor algum aporte à hegemonia capitalista. Dentro da "detestável" divisão do trabalho, se contentou em explorar operários até que morram exaustos, sem nunca ter lhe ocorrido aprimorar a sociedade e gerar ciência para aperfeiçoar o processo do capital.

Dedicou-se a importar tudo, até suas ideias e as formas que as gerações vindouras deveriam seguir. Aprendeu a ser pusilânime e a ambicionar dividir espaço com a elite burguesa internacional, para a qual nunca deixaram de ser "latinos", com todos os preconceitos e estereótipos que isso implica em sociedades capitalistas desenvolvidas.

Sua falta de dignidade provocou uma invasão paulatina, mas ininterrupta, de uma cultura estrangeira, e nos levou ao extremo de acreditar que as coisas importadas são melhores. E toda essa deformação e carência de identidade é o que tem sido transmitido às classes subalternas, que tendem a se comportar como ela. Não é estranho que a classe média lute todos os dias entre seu amor ao "belo" sonho americano e o horrível pesadelo que é tornar-se cada vez mais pobre.

Suas políticas à frente do Estado têm sido sempre fabricadas na casa do senhor transnacional, e trate-se de bananas, café, camarões, petróleo, ou veículos, computadores e aviões, nossa classe dominante apenas é capaz de entender como extrair mais dinheiro dos mais desafortunados sem ter que criar mais postos de trabalho ou trazer mais igualdade para a região.

E quando se trata de aprofundar o receituário neoliberal, os teóricos do saque precisam apenas se aproveitar daquilo que é abundante na direita local: sua ganância, para que nossos povos sejam novamente vítimas do assalto incessante. A direita chegou à convicção de que não há necessidade de compreender o que estão aplicando, basta apenas executar para obter grande lucros.

Ver o recente êxito de Mauricio Macri e a velocidade com que foi aplicada a cartilha neoliberal, em uma Argentina que vinha de um momento especial rumo ao bem-estar social, causou perplexidade em muitos. Como em todos os casos, essa guinada só trará sofrimento e pobreza. O mesmo se pode dizer do governo de Temer no Brasil, que conspirou para retirar do povo tudo o que se avançou nos últimos 16 anos.

Que dizer de Peña Nieto, que simplesmente segue a estrada marcada pelo infortúnio do povo mexicano, em uma nação que possui a força cultural histórica e ancestral para se converter em uma potência, mas que aceitou nas últimas décadas o papel de "vizinho pobre" daqueles que acreditam ser um império infinito. Para a direita mexicana foi suficiente destruir o orgulho de um grande povo e lhe retirar a opção de seguir um outro destino.

E que dizer, ainda, dos países da América Central, onde as classes dominantes são improdutivas e apenas propõem como solução a sacrossanta "inversão estrangeira". Sua desfaçatez chegou a tal ponto que nem se comprometem mais com o desenvolvimento de seus países, e sim em vendê-los, alugá-los, concessioná-los ou, simplesmente, entregá-los para que outros o façam. E, apesar disso, se proclamam "fazedores de riqueza" e se dizem "criadores de empregos", deixando de lado a importância social do trabalho.

Do ponto de vista capitalista, a direita latino-americana mostrou seu fracasso brutal e retumbante. Pode ser a opressora e assassina de seus povos, mas nunca sairá da miséria mental, que a condena ao "nanismo" eterno e a ser portadora da tragédia, do desespero e da miséria de suas sociedades. É absolutamente falso que a direita "saiba governar", e aqueles que conseguiram se livrar dela deveriam pensar duas vezes antes de permitir que voltem a dirigir os rumos da nação.

Não é difícil mostrar que a linhagem desta direita cavernosa remonta diretamente àqueles que lutaram contra o ideal bolivariano; os mesmos que fuzilaram Morazán, os mesmos cúmplices do assassinato de Che Guevara. São aqueles que preferiram receber alguns trocados e a benção do inimigo, para converterem-se em capatazes de sua própria casa. Linhagem indigna, carregada de vergonha e responsável por cada mancha em nossa história.

Como se atrevem a dizer que produzem riqueza? Que são os motores da economia? Economia de "quem"?

Vale a pena fazer um estudo profundo do trágico resultado da gestão da direita criolla [descendente de europeus nascido na América, N.T] e mostrá-lo aos nossos povos.

Falam frequentemente na corrupção, um mal antigo que cresceu em nossas latitudes com os pais e avós daqueles que hoje se dizem profetas da nossa salvação. Herdaram não apenas o saque, mas a vocação para roubar.

No dia em que houver uma verdadeira luta contra a corrupção em nossos países, não haverá nem ricos nem direitistas.



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